Grandes Monstros do Cinema
- Iury Salk Rezende
- 14 de jun. de 2020
- 19 min de leitura


A história do Cinema e a dos filmes de Horror iniciaram bem próximos. O curta-metragem Le Manoir du diable (1896), de Georges Méliès, conta a historia de um cavalheiro que entra na “casa” do “diabo” e é atacado por ilusões, a intenção era apenas entreter as pessoas como em outras produções de George, mas as imagens impactaram os telespectadores e o curta se tornou a primeira produção de terror da história. Thomas Edison que registrou 2 332 patentes. O fonógrafo foi uma de suas principais invenções. Outra foi o cinematógrafo, a primeira câmera cinematográfica bem-sucedida, com o equipamento para mostrar os filmes que fazia. Seus curtas datam desde 1985 com “The Execution of Mary Stuart” e em 1910 realizou a primeira adaptação do romance de Mary Shelley “Frankentein, O Moderno Prometeus”.

The Execution of Mary Stuart

Frankentein, O Moderno Prometeus (Edison -1910)
Mas, antes de o gênero firmar-se como tal, as imagens de horror já circundavam o suporte, construindo conceitos visuais e alinhavando elementos de composição da atmosfera imagética, típica da pictografia de terror. A transmutação das criaturas fantásticas da literatura romântico-gótica em imagens, bem como o incessante aperfeiçoamento dessas figuras no audiovisual, foram impulsionadas e, por sua vez, impulsionaram a evolução das técnicas cinematográficas, tanto em termos de linguagem, quanto em termos de tecnologia de produção. David Skal, crítico de cinema norte-americano especializado na história do entretenimento de horror no século XX, oferece um resumo curioso sobre a relação intrínseca entre o gênero e a atividade cinematográfica:
“A maioria das histórias do gênero horror têm antecedentes mitológicos e literários. Horrores e monstros da antiguidade se encontraram na ficção popular do século XIX que, mais tarde, foi melhorado através dos meios de comunicação de massa do século XX que, por sua vez, propiciou monstros maiores e melhores, filmes mais caros, gritos mais altos e o desenvolvimento de novas e espetaculares tecnologias para criação do terror. Em resumo, esta história pode ser apresentada como uma crônica simplista e auto-referencial de progresso.”(SKAL, 2001, p. 23)
O horror projetado, ou seja, aquele sentimento controlado para fins de entretenimento, até então inédito para a humanidade, surgiu com a ficção literária dos séculos XVIII e XIX. Não por acaso, essas histórias fantásticas, de mistério e de sobrenaturalidade, foram também o principal argumento do gênero horror no audiovisual que começou a se desenvolver no início do século XX. O Romantismo foi também a principal influência dos artistas alemães do Expressionismo, movimento que deu origem a imagens de horror no audiovisual. Percebe-se, assim, que, das páginas literárias para as telas de cinema, o caminho foi natural e atendeu às exigências das audiências da época. No entanto, se, por um lado, a literatura de ficção fomentou as tramas cinematográficas, por outro, os acontecimentos reais que atingiam o homem naquele início de século determinaram a estética das imagens de terror, criadas para materializar as histórias de ficção no audiovisual. Assim, é possível dizer que com a Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918), os panoramas econômicos e sociais da Europa e dos Estados Unidos, bem como a tensa relação entre essas nações, não só potencializaram o típico sentimento depressivo de início de século como, também, motivaram as correntes de pensamento, as artes, a literatura e, pela primeira vez, as imagens de cinema. J'accuse é um filme mudo francês de 1919, dirigido por Abel Gance é um destes exemplos. Ele justapõe um drama romântico com o pano de fundo dos horrores da Primeira Guerra Mundial, e às vezes é descrito como um filme pacifista ou anti-guerra.



Imagens de J'accuse (Gance -1919)
O trabalho no filme começou em 1918, e algumas cenas foram filmadas em campos de batalha reais. A procissão de mortos e rostos e corpos deformados de forma horrível causaram extremo impacto ao público da época, e foi forte influencia para os maquiadores como Jack Pierce, mestre do make-up dos filmes de horror da Universal. Na Alemanha, no período de 1900 a 1930, O Expressionismo, escola de artes plásticas que bebeu de fontes como os romances góticos e do Romantismo do século XIX, também se estendeu para o Teatro e o Cinema. A magnitude estética do Expressionismo alemão determinou, dentre outros aspectos, o conceito imagético dos filmes de horror ao redor do mundo, incluindo os Estados Unidos.
Tempestuoso e sombrio, o Expressionismo alemão convergiu sua estética para as revoltas e paixões humanas. Um dos primeiros filmes que inaugurou esta nova forma de audio-visual (apesar de ser considerado silencioso, o cinema sempre usou música e até efeitos sonoros) foi o Estudante de Praga (2013) de Paul Wegener, baseado em um conto de Poe, William Wilson, e que teve mais duas versões nos próximos anos. Este filme, que tinha técnica ainda incipiente, foi à primeira iniciativa de introduzir este olhar que foi seguido por outro filme pré-expressionista, Unheimliche Geschichten (1919) de Richard Oswald, que adaptou vários contos de Poe, como o Gato Preto. Mas o filme que foi pedra angular para esta nova forma de expressão e que esteticamente deu a melhor aparência para nos conduzirmos neste universo de estranhamentos e alucinações foi o primeiro filme da Escola Expressionista do Cinema: O Gabinete do Dr Caligari (1920) de Robert Wiene, que neste ano completa 100 anos, lançado nos cinemas em 26 de fevereiro de 1920.

A partir do lançamento de O Gabinete do Dr. Caligari, ficou claro que o cinema seria o suporte ideal para os Expressionistas, um verdadeiro deleite para a concretização das visões violentas e confusas que prevaleciam na literatura e nas artes do movimento.
“Assim, diretores como Robert Wiene e Richard Oswald4 , que mais tarde se revelaram artistas apenas de segunda ordem, conseguiram iludir na estreia, assinando filmes que pareceram, no momento, dotados de qualidades notáveis. Nessas obras, a morbidez de uma dissecação psicológica marcada pelo freudismo e a exaltação expressionista casavam bem com as fantasias românticas de Hoffmann e Eichendorff. Para a alma torturada da Alemanha de então, tais filmes, repletos de evocações fúnebres, de horrores, de uma atmosfera de pesadelo, pareciam o reflexo de sua imagem desfigurada e agiam como uma espécie de exutório.” (EISNER, 2002, p. 25)
O Gabinete do Dr. Caligari não só projetou o ideal do filme de horror na Europa e nos Estados Unidos, como também forçou a indústria norte-americana a definir seus rumos em relação ao gênero no cinema. A Inovação estética e sua original abordagem temática influenciou diretamente para o sucesso dos vampiros nas telas, com o lançamento de Nosferatu - Nosferatu, eine Symphonie des Grauens - (1922), e, mais adiante, com Drácula – Dracula - (1931), da Universal Studios americana. Resta, portanto, dissecar as motivações para a concepção de imagens tão revolucionárias e impactantes, com apelos surrealistas.

Outro elemento predominante na fecundação do gênero horror cinematográfico foi o terror causado pela figura do Duplo (Doppelgänger). Três foram os estímulos para a recorrência dessa questão nas imagens expressionistas: as influências românticas do movimento alemão, o estudo realizado por Otto Rank, em 1914, e o retorno dos jovens mutilados à sociedade alemã. O primeira estímulo diz respeito à literatura. O tema do Duplo permeou as histórias fantásticas durante todo o Romantismo gótico dos séculos XVIII e XIX, a exemplo dos contos de Maupassant, E.T.A Hoffman, Goethe e Dostoiévski.
O Filme citado anteriormente, O Estudante de Praga (1913), conta a história de um estudante com problemas financeiros que vende seu reflexo para um homem misterioso, justapondo a expressão artística da época com sua principal fonte de referência. Foi um filme extremamente importante, pois, além de inaugurar o cinema expressionista, inspirou Otto Rank a realizar um dos estudos mais relevantes da história da psicanálise – O Duplo (Der Doppelganger –1914) -, que, juntamente com outros dois textos de Freud - O Narcisismo (Zur Einführung - 1914) e O Estranho (Das Unheimliche – 1919) -, formam a base para a discussão do desdobramento do ser em reflexos, sombras e espíritos, conceitos fundamentais para as figuras de horror, em especial, os vampiros.
Muitos teóricos do cinema e estudiosos do gênero horror consideram O Estudante de Praga o primeiro filme de horror audiovisual. Essa é uma teoria que se sustenta em função do tema do Duplo, recorrente nas histórias fantásticas desde o movimento literário romântico gótico dos séculos XVIII e XIX. No entanto, O Gabinete do Dr. Caligari é o primeiro filme com preocupações estéticas que influenciaram diretamente o cinema de horror comercial.
Um dos filmes mais humanista produzidos durante o movimento alemão foi A Morte Cansada - Der müde Tod – (1921), co-redigido e dirigido por Fritz Lang. A obra reunia o tema do Duplo na figura da alma de uma noiva morta que negociava diretamente com a morte a vida de seu jovem noivo ─ um retrato da incoerência sombria sentida pela população alemã ao ver seus jovens sendo mortos ou mutilados durante a guerra. A questão do Duplo assumiu diversas abordagens ao longo da história do cinema de horror e tornou-se um dos temas mais recorrentes dentre todos do gênero.

A Morte Cansada - Der müde Tod (1921)
Os expressionistas, nas artes plásticas emprestaram o gosto pelo claro-escuro, técnica desenvolvida para conferir mais realismo e contraste às obras, com o intuito de expressar mais drasticamente o drama humano, apresentado nas composições. Com o passar do tempo, a iluminação e a sombra passam a adquirir uma conotação simbólica, conferindo significados específicos aos elementos banhados pela luz, de tal forma que essa prática acaba distanciando-se dos valores naturais para se aproximar do julgamento humano. A sombra é o recurso de referência na composição das imagens expressionistas, mas, especificamente, a partir de O Gabinete do Dr. Caligari, obra na qual a preocupação estética assume o centro das preocupações artísticas, a iluminação direcionada a pontos específicos assume papel semelhante ao desempenhado nos quadros do período Barroco: a de conferir significado aos pontos envoltos pela luz. Aqui, a luz faz parte da composição como elemento de significação, componente da sintaxe visual que, juntamente com a sombra, é responsável pelo simbolismo dos elementos de cena. A sombra é um componente repleto de tabus e significados adjacentes. Se, na natureza, a sombra é o desdobramento natural de um corpo, na arte, ela é a própria tradução do misterioso, “as sombras são imagens inquietantes, perigosos esconderijos para bandidos de tocaia, são duplicações aborrecidas das figuras” (CASATI, 2001, p. 217). Mais do que isso, as sombras são desconcertantes, são espaços fúnebres que dão vazão a qualquer tipo de sobre-naturalidade. No Expressionismo alemão, as sombras aproximavam-se de todas essas questões e, ainda, representavam o espírito lúgubre do pensamento alemão.

É compreender que a relação que os alemães estabeleceram com o claro-escuro em suas imagens cinematográficas, perpetuou-se pelo cinema de horror: a luz artificial destaca o ponto de atenção enquanto a sombra, ou a falta dela, é o mais forte indício de que há um perigo iminente ou um mistério terrível.
A partir de Caligari os cânones da linguagem do cinema de horror são fundados e imitados por todo o cinema mundial. Atores como Conrad Veidt e Paul Wegener tornam-se referencia de interpretação de monstros e personagens possuídos ou deformados mentalmente pelos seus papeis em: O Gabinete do Dr Caligari, Unheimliche Geschichten, As Mãos de Orlack, Museu de Cera, O Homem que Ri (Veidt); O Golem, Estudante de Praga, The magician (Wegener).

Cena de O Golem
A Iluminação expressionista e seu jogo de luzes e sombras, cenografia estilizada e interpretações irrealistas forma importadas para o gênero que se estava consolidando também nos EUA, através do assombroso ator e próprio maquiador Lon Chaney. Este ator especializou-se em representar personagens monstruosos, atormentados e grotescos, ficou sendo chamado pelos críticos de cinema da época de " O homem das mil faces ". Seus filmes fizeram muito sucesso nos anos 20 com produções caras e bem produzidas, mas que tinham retorno financeiro garantido pelos seus estúdios como “O Corcunda de Nottre Dame” (1923) e “O Fantasma da Ópera (1925).


O Fantasma da Ópera (grande sucesso de Lon Chaney - O Home das mil faces.

Lon Chaney e seu estojo de maquiagem.
O Sucesso dos filmes de Chaney e a garantia de que o público estava sedento por histórias macabras impulsionou a Universal Studios a adaptar diversos clássicos da literatura e do teatro gótico como Dracula (1931), Frankenstein (1931) A Múmia (1932), O Medico e o Monstro (1931) este da MGM, além de adaptações de contos de Edgar Allan Poe como: Crimes da Rua Morgue (1932), O Gato Negro (1934) e o Corvo (1935). Estes filmes foram bem rendosos e no caso de O gato Negro e O Corvo foram a maior bilheteria da Universal nos anos de 1934 e 35.
Drácula seria interpretado por Conrad Veidt e dirigido por Paul Leni, que emigrou da Alemanha para os EUA para dirigir, O Home que Ri, mas sua morte inesperada causou a mudança na direção para Tod Browning, que escalou Chaney para o papel do príncipe das trevas. Como Chaney também morreu antes de começar as filmagens de Dracula o papel foi para Béla Lugosi, ator húngaro que estava encenando Dracula na Broadaway.

Cena de Béla Lugosi em Dracula (1931)
Béla fez vários outros filmes de horror, como também de outros gêneros. Dentre os de horror, merecem destaque Murders in the Rue Morgue, The Raven, Mark of Vampire, dentre outros. Porém, o ator não conseguiu estabilidade no cinema, e passou a partir de meados da década de 30 a atuar em filmes baratos. Ainda conseguiu papéis bons como em “O Filho Frankenstein”(1939), a melhor interpretação de sua carreira, The Ghost of Frankenstein e The Corpse Vanishes. Porém, estereotipado como "Drácula" e seguindo o mesmo declínio do gênero na década de 40, no qual os monstros clássicos protagonizavam filmes em que se enfrentavam, ou comédias com a dupla Abbott e Costello, Bela ficou desempregado.
Minha coleção de bonecos e estátuas do personagem Drácula, interpretado pelo ator húngaro Bela Lugosi.
Foi redescoberto por Ed Wood, considerado o pior diretor da História, que gravou alguns filmes com ele. O último filme de Béla Lugosi foi Plan 9 from Outer Space(1956), Considerado como o pior filme já feito, de Ed Wood.

Cena de Glen ou Glenda de Ed Wood

Cena de Plan 9 from Outer Space(1956)
Outro ator que conquistou fama e admiração do público foi Boris Karloff. Este aceitou o papel da criatura de Frankenstein (1931) que Lugosi recusou, por achar o personagem grotesco e limitado, que só grunhia. Com seu rosto cadavérico, o olhar fundo mas expressivo, reforçado pela mágica maquiagem do mestre Jack Pierce, Karloff foi a personificação mais arraigado do monstro, que inspirava tanto repulsa e pavor, como também comoção e sofrimento. Este misto de sentimentos causados no público, devido a sua ótima atuação de um personagem que não articulava palavras ficou indelével pra a História do Cinema, e nunca surgiu um monstro mais impactante como o de Frankenstein. Karloff ainda faria o monstro em mais duas produções, “A Noiva de Frankenstein”(1935), considerado por muitos críticos como o melhor filme de toda a série da Universal e na continuação “O Filho de Frankenstein”(1939) que reunia mais dois grandes atores do cinema de Horror, Bela Lugosi e Basil Rathbone.
Rathbone, além de participado de numerosos longas de Horror, como os filmes góticos de Roger Corman, freqüentemente retratava vilões ou personagens moralmente ambíguos, como o Sr. Murdstone em David Copperfield (1935) e Sir Guy de Gisbourne em The Adventures of Robin Hood (1938). É mais conhecido por sua representação de Sherlock Holmes e vilões de filmes capa e espada como em The Mark of Zorro e Captain Blood.

Basil Rathbone em "O Filho de Frankenstein (1939)"
Outro ator de muito destaque no gênero foi Peter Lorre, eternizado no papel de um serial Killer real em “M, O Vampiro de Dusseldorf (1931) de Fritz Lang”. Sua participação neste filme foi vital para chamar a atenção do jovem diretor britânico Alfred Hitchcock que o convidou para trabalhar como vilão em dois de seus filmes ingleses; O Homem que sabia Demais (1934) e O Agente Secreto (1936). Como era uma judeu e Hitler tinha assumido o poder em 1934, Lorre partiu para a América e não voltou mais para a sua terra natal até o fim da guerra. Seu primeiro filme na América foi Dr. Gogol – O Médico Louco (Mad Love, 1935), de Karl Freund.

Peter Lorre em Mad Love (1935)

Peter Lorre em M (1931)
O filme foi proibido em alguns países na época devido às cenas fortes da cirurgia. Mad Love conta tem a direção do famoso fotografo dos principais filmes expressionistas alemães Karl Freund, que dirigiria seu primeiro filme na América a clássica adaptação da peça de John Balderson “A Múmia” (1932) com Karloff. Mad Love contou ainda com a participação do ator Colin Clive (que fez Victor Frankenstein nos filmes da Universal) como o pianista. Ele e o Lorre fizeram uma forte amizade nesse filme, e o ator iria no funeral do Clive dois anos depois. Em seguida, Lorre participaria da versão de Crime e Castigo (1935) no papel principal de Raskolnikov (aqui chamado Roderick vez de Rodion). Entre 1937 e 1938 ele se tornaria o Mr. Moto em uma série de filmes de detetives. Lorre voltaria ao gênero do Horror e “Os Cinco Dedos da Morte (1946) de Robert Florey, diretor de Os Crimes da Rua Morgue(1932), e novamente impressionou pela sua atuação marcada pela expressão ensandecida e seus olhos esbugalhados e paroxismo de terror.

Bela Lugosi, Peter Lorre e Boris Karloff.
A Década de quarenta, com citei anteriormente, sofreu um declínio considerável no gênero, a não ser o maravilhoso ciclo de filmes de horror nos Estúdios da RKO, através do produtor Val Lewton. Diferente dos filmes de monstros da Universal que tinham o intuito de apenas assustar o público, os filmes de Lewton e da RKO visaram o terror sério, polido e atmosférico, com influências diretas do expressionismo alemão e dos filmes Noir. Lewton é citado pelo diretor Vincente Minnelli no filme de 1952 “Assim Estava Escrito” como um produtor, interpretado por Kirk Douglas, que ao ser colocado para produzir um filme de homens panteras, com figurinos ridículos ele pergunta ao seu diretor: “O que realmente a humanidade tem medo” e ele próprio responde “...A Escuridão”.
Cenas de "Assim estava escrito" (1952) em que Kirk Douglas esplica o que causa medo no público, assim com Lewton fez na RKO.
Com certeza esta cena traduz bem o pensamento a forma como Lewton idealizava o horror, através de uma atmosfera mais sombria, misteriosa, secreta e psicológica, muito diferente dos monstros maquiados na tradição do Grand Guignol (teatro na região do Pigalle em Paris. Desde a sua inauguração em 1897 até à data do seu encerramento em 1962, especializou-se em espetáculos de horror naturalista com peças de teatro com histórias macabras e sangrentas). A preocupação era oferecer ao público, filmes que questionassem a natureza humana e sugerissem o medo em vez de mostrar diretamente o terror. Foram trabalhos reflexivos e poéticos na construção narrativa da psicologia dos seus personagens, com o intuito de compreender as verdades interiores da subjetividade humana. Entre a série de filmes neste período, se destacaram os trabalhos de Jacques Tourneur, Sangue da Pantera e A Morta-Viva e os de Mark Robson como A Sétima Vítima e Ilha dos Mortos. Bela Lugosi e Boris Karloff tiveram a oportunidade de trabalhar em alguns destes filmes, mas com uma interpretação mais contida e realista. O Diretor sueco Ingmar Bergman já manifestou ser um ardoroso fã desde genial ciclo de filmes de horror de Lewton, assim como Allfred Hitchcock.


Cena de "A Morta-Viva"

Val Lewton na RKO.

Cena de Sangue de Pantera (1942)

Cartazes de filmes produzidos por Val Lewton.
A Universal ainda lançaria um novo astro neste gênero que foi o filho do grande ator Lon Chaney, que deu continuidade ao nome do pai e de sua família a esta forma de espetáculo e arte. Seu nome verdadeiro era Creighton Tull Chaney. Filho do Ator Lon Chaney com Frances Cleveland Creighton Chaney, cantora que acompanhou Chaney pelos Estados Unidos, nasceu no estado de Oklahoma. O casamento de seus pais era conturbado, resultando na tentativa de suicídio de sua mãe em 1913. Com a repercussão do caso, a justiça determinou que Creighton, então com oito anos de idade, deveria ficar sob os cuidados de uma instituição para órfãos e filhos de pais separados. Creighton retornou a morar com seu pai quando este se casou pela segunda vez e comprou uma casa, no ano de 1915. Creighton desde cedo quis ser ator, mas seu pai sempre o aconselhou a não seguir esta carreira. Seu pai faleceu no ano de 1931, e então Chaney decidiu tentar a carreira no cinema. Lon Chaney Jr. teve seu primeiro trabalho no cinema em uma ponta não creditado no filme Girl Crazy, do ano de 1932, porém somente adotou o nome artístico em alusão a seu pai anos depois. Foi após o filme Of Mice and Man, de 1939, que obteve certo destaque. Em 1941, obteve um contrato com a Universal Pictures, estrelando o filme Man made Monster.
Em 1941, Chaney teve a oportunidade de interpretar seu personagem mais famoso, Larry Talbot, o Lobisomem, no clássico The Wolf Man, da Universal Pictures. O filme foi um enorme sucesso e possibilitou a continuação do personagem em vários outros filmes e a consolidação de Chaney Jr. Seus principais filmes foram Frankenstein encontra o Lobisomem, O Filho de Drácula, A Casa de Drácula, A Casa de Frankenstein, Ghost of Mummy, dentre a participação em diversos westerns. A imagem de Chaney se tornou popular, e as comparações com seu pai foram inevitáveis. Os personagens de Chaney tinham como maior característica seu nível dramático, geralmente personagens com conflitos psicológicos, o que garantiu uma imagem mais humana em sua interpretação do Filho de Drácula e O Lobisomem. Assim como Bela Lugosi e Boris Karloff, Chaney teve dificuldades com o declínio da Universal na década de 40. Porém conseguiu conquistar papéis fora do gênero terror, principalmente na década de 1950, mas sem nunca mais obter a fama dos anos 40.
Outro ator que se consagrou como monstro no cinema foi John Carradine, que apesar de ser muito magro e com um rosto com feições delicadas era um interprete de talento e participou de produções de Cecil B. de Mille em Heaven on Earth (1930) e John Ford ,com papéis marcantes em Nos Tempos da Diligência (1939) e As Vinhas da Ira (1940), O Home que matou o Facínora (1961). Encarnou Dracula nos filmes da Universal da década de 40 em “A Casa de Frankenstein” e “A Casa de Dracula” e parir destes dois filmes foi o ator que mais interpretou o Rei dos Vampiros na história, inclusive em produções que iriam de “B” a “Z”, como “Dracula contra Billy The Kid”(1966) e produções mexicanas. Sua ultima participação como monstro também foi seu último filme “Grito de Horror”(1981) de Joe Dante, como um lobisomem septuagenário e um pouco senil.


Grito de Horror (1981) Último filme de Carradine.

Cena de "A Casa de Dracula"

Cena de "A Casa de Frankenstein"
Um ator que encontrou papeis nos filmes de horror com mais facilidade que seus colegas no declínio do gênero nos anos 40 e 50 foi Vicent Price. Nascido no Missouri, Price veio de uma família rica, cercada por um ambiente cultural acima dos padrões e envolta em tradições antigas à moda européia. Começou no teatro, depois passou ao cinema onde ficou mundialmente conhecido por contracenar em filmes de suspense e terror, o que lhe rendeu a alcunha de Mestre do Macabro ("Master of the macabre", no original). A sua trajetória é longa e inclui muitos clássicos, como: Laura (1944); Amar foi Minha Ruína (1945); O Solar de Dragonwyck (1946); Os Três Mosqueteiros" (1948); Os Dez Mandamentos" (1956); A Mosca da Cabeça Branca" (1958); Força Diabólica" (1959); "A Casa dos Maus Espíritos" (1959); "Robur, o Conquistador do Mundo" (1961); "No Domínio do Terror" (também chamado de Contos de Terror) (1963); "Mortos que Matam" (também chamado de The Last Man on Earth) (1964); "O Caçador de Bruxas" (1968);. Vincent Price também estrelou o criativo ciclo de adaptações de obras de Edgar Allan Poe dirigidas por Roger Corman, na década de 1960: "O Solar Maldito" (também chamado de A Queda da Casa de Usher) (1960), "Mansão do Terror" (1961), "Muralhas do Pavor" (1962), "O Corvo" (1963), "A Máscara da Morte Vermelha" (também conhecido como A Máscara Mortal) (1964), "O Túmulo Sinistro" (também chamado de A Tumba de Ligeia) (1964). Nos anos 70, porém, surgiram mais algumas obras que tornaram sua filmografia ainda mais rica, como: "O Uivo da Bruxa" (1970), Grite, Grite Outra Vez!" (1970), "O Abominável Dr. Phibes" (1971), "A Câmara de Horrores do Abominável Dr. Phibes" (1972), "As Sete Máscaras da Morte" (também conhecido como Teatro da Morte) (1973), "A Casa do Terror" (1974), (ao lado do "cavalheiro do terror" Peter Cushing). Na década de 1980 destacou-se na "A Mansão da Meia-Noite" (também chamado de A Casa das Sombras) (1983), que reúne, num só fôlego, Peter Cushing, John Carradine, Christopher Lee e Vincent Price. Este filme, repleto de clichês e situações previsíveis, na verdade foi uma espécie de homenagem a esses atores que são a própria história do gênero horror.

Quatro grandes astros do Cinema de Horror: Christopher Lee, Vicent Price, John Carradine e Peter Cushing.

Roger Corman e Vicent Price no intervalo de filmagens.

Foto publicitária de The Bat.

Foto publicitária de Muralhas do Pavor, filme com Vicent Price e Peter Lorre.
A Década 50 ficou conhecida como o maior declínio que o gênero e os atores que encarnavam monstros sofreram, desde os primeiros filmes expressionistas. Os astros consagrados eram substituídos por dubles musculosos em roupas de borrachas, aranhas e insetos gigantes e monstros radioativos. Foi a Era da Guerra Fria, Caça as Bruxas, e o inimigo assustador eram a ameaça vermelha e o pavor de uma guerra nuclear, e suas terríveis conseqüências. Desde que foi notificado que os russos criavam, através de alteração genética, legumes gigantes, e disputavam com os EUA um enorme arsenal atômico, Hollywood aproveitou usar deste medo coletivo e explorou através de filmes como “Vampiros de Almas” (1956) de Dom Siegel e filmes de Jack Arnold: Tarântula(1955), A Ameaça Veio do Espaço (1953), O Monstro da Lagoa Negra (1954) e a obra-prima “O Incrível Homem que encolheu”(1957). Mas infelizmente ao lado destes filmes que se tornaram clássicos, o cinema dos EUA foi inundado pro filmes série Z, como os dirigidos por Ed Wood, exibidos em cinemas de periferia e drive - in para um público adolescente.

Tarântula (1955)


Cenas de Revenge of the Creature (1955)

“Vampiros de Almas” (1956) de Dom Siegel
O resgate aos bons tempos do Horror Gótico retornaria com muito sucesso na produtora inglesa Hammer, que produziu versões coloridas, com direito muito sangue e sexo, dos clássicos Dracula, Frankenstein, Múmia, Lobisomem, além de filmes sobre Zumbis, Megeras, Mulheres répteis e alienígenas na série Quatermas. Os atores que encabeçavam estas produções foram Christopher Lee e Peter Cushing, que emprestavam fleuma e elegância aos monstros humanos e sobrenaturais.
Christopher Lee começou sua carreira no teatro, desde cedo dedicando-se a papéis de malfeitores. Seu primeiro personagem foi Rumpelstiltskin, antagonista do conto homônimo dos Irmãos Grimm. Lee ficou conhecido mundialmente interpretando o Conde Drácula, personagem que encarnou por diversas vezes pelos estúdios da britânica Hammer Film Productions. Atuou também na trilogia O Senhor dos Anéis e em dois filmes da trilogia O Hobbit interpretando o personagem Saruman. Sua carreira também foi marcada pelos filmes dirigidos por Tim Burton, como A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça, A Fantástica Fábrica de Chocolate e Sombras da Noite, e emprestou a voz a personagens de A Noiva Cadáver e Alice no País das Maravilhas. Também atuou como Conde Dooku em Star Wars episódios II e III. Sua carreira foi bastante prolífica, com mais de 200 produções.

Cena de Horror de Dracula (1958)

Christopher Lee, o melhor Dracula do Cinema.
O grande ator britânico Peter Cushing atuou em diversas produções para o cinema e TV, encarnando personagens famosos do gênero horror e ficção científica como Dr. Victor Frankenstein e Van Helsing para a produtora Hammer Films, além de Grand Moff Tarkin, em Star Wars, em 1977. Filho de George Edward Cushing e Nellie Marie, nasceu em Kenley, no condado de Surrey. Atuou no teatro londrino até mudar-se para Hollywood, em 1939, onde atuou em The Man in the Iron Mask no mesmo ano. Outros filmes nos quais participou foram Chump at Oxford (1939), com Stan Laurel e Oliver Hardy, Vigil in the Night (1940), e They dare not love (1941). Entretanto, depois de uma curta estada, Cushing voltou à Inglaterra. Em Nova York interpretou na Broadway e no Canadá. Em apoio à sua pátria, contribuiu para o esforço de guerra durante a Segunda Guerra Mundial unindo-se à Associação de Serviços Militares de Entretenimento. Após a guerra, teve grande aparição com Laurence Olivier no filme Hamlet, no qual seu futuro amigo e companheiro de filmagens, Christopher Lee, teve um pequeno papel. Ambos também apareceram em Moulin Rouge, porém só voltariam a se reunir nos clássicos filmes de terror. Durante a década de 1950 chegou a se tornar familiar na televisão inglesa, aparecendo em numerosos filmes, iniciando um trabalho com a lendária Hammer Film Productions em suas novas versões do terror clássico de 1930. Seu trabalho na produtora está intimamente relacionado ao diretor Terence Fisher, realizando papéis relevantes em filmes, tais quais, The Curse of Frankenstein, Drácula, The Hound of the Baskervilles e The Mummy. Seus papéis mais notáveis foram os de Sherlock Holmes, Barão Frankeinstein e Van Helsing. Cushing ficou bem conhecido por interpretar o Barão Victor Frankenstein e o Professor Van Helsing em uma longa série de filmes de terror produzidos pela Hammer Film Productions na década de 1950, 1960 e 1970. Várias vezes encenou com Christopher Lee, de quem se tornou seu melhor amigo.

Cushing como Victor Frankenstein.

Lee e Cushing, dois grandes amigos.
Mais tarde, declarou que as suas escolhas acerca de papéis se baseavam no que achava que seria aceito pelo público. "Quem quer me ver como Hamlet? Muitos poucos. Mas milhões de pessoas querem me ver como Frankenstein, de modo que é o que eu faço". Seguiu interpretando os papéis de Doutor Frankenstein e Van Helsing, assim como outros personagens de horror nos vinte anos posteriores. Se destacou também em filmes de outra grande produtora de cinema de terror, a rival Amicus Productions, incluindo películas como Dr. Terror's House of Horrors (1965) e Torture Garden (1967). Em meados da década de 1970, as companhias haviam parado a produção, porém Cushing já se estabelecera como uma estrela do gênero.
Como Bela Lugosi, e ao contrário de Boris Karloff ou Vincent Price, Cushing não era um ator excepcional mas tinha o tipo adequado para se consagrar como astro de filmes de terror. A figura esquelética, a voz educada e soturna, o ar aristocrático e a habilidade de aparentar calma, autoridade e obstinação um tanto maníacas o transformaram em intérprete ideal para o enlouquecido Dr. Frankenstein e o incansável caçador de vampiros Van Helsing. Curiosamente, as mesmas características couberam em outro personagem famoso, Sherlock Holmes. Também é lembrado pela participação, em 1977, em Guerra nas Estrelas, como o Governador Tarkin, parceiro de vilanias de Darth Vader.

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